O DONO DO TEMPO

O tempo com cheiro de chocolate fazia das tardes segundos.

Quando eu via, já era hora de dormir – e rezar. Ah, como era chato ter que rezar. Logo eu, que de tão distraído acabava cantando. Mas ninguém sabia desse meu terrível segredo. Uma noite, no meio da cantoria, achei que eu era um passarinho e voei por todo o quarto em direção ao esconderijo da manhã. Mas a janela não me permitiu partir.

Desisti de ser um pássaro e virei uma formiga. Fui muito feliz como formiga até esbarrar na montanha do tapete dobrado na porta do quarto e não conseguir transpô-lo.

Muito cansado, acabei dormindo e sonhando que era dono de uma fábrica de chocolates – bondoso, distribuía a todos os meus amigos e familiares. Chocolates com asas, antenas, sardas, barbatanas, manchas, rabos de sereia, em formato de lua, ilha, até de vento tinha. Chocolates azuis, velhos, novos, amarelos, até de onda do mar tinha.

Também fiz muitos relógios de chocolate e às vezes com eles conseguia grandes feitos: subornava meu pai a só ir trabalhar de tarde, atrasava os encontros de minha mãe, ajudava meu irmão a aproveitar cada mínimo segundo de sua infância e propiciava a meus pequenos amigos momentos de muita alegria e reverência à minha pessoa.

Hoje é muito bom saber que, por um dia, que coube dentro de uma noite, eu fui o dono do tempo.

2008